Como vocês sabem, caro leitor, a energia elétrica é um bem essencial para cada um de nós. Além de nos propiciar qualidade de vida, a energia é um dos principais motores para o desenvolvimento das indústrias e movimentação de nossa economia. Por conta disso, o seu fornecimento deveria ser garantido de maneira eficiente, com segurança, bons serviços e preços, porém segundo dados apresentados em um estudo elaborado pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro, a Firjan, no que diz respeito ao custo da energia em nosso país, a situação é alarmante. Temos um custo tarifário altíssimo que impacta a competitividade brasileira em relação a outros países.
Este relatório evidencia que a tarifa média de energia elétrica para a indústria é de 329,00 R$/MWh, e possui uma variação que pode chegar a até 63% entre os estados. Quando comparamos estes dados com as tarifas praticadas em outros países, como por exemplo os outros membros do BRICS, os números brasileiros chegam a ser 134% maiores do que a média das tarifas da China, Índia e Rússia (140,7 R$/MWh). O mesmo padrão pode, inclusive, ser verificado quando comparamos com outros países da América Latina. Confira todos esses dados nas tabelas abaixo:
De acordo com outro estudo divulgado pela Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc), o que se observa é que a tarifa média do Brasil chega a ser uma das mais caras do mundo, figurando na sexta posição entre todos os países pesquisados. O custo da energia, aqui, é 127,3% maior que o praticado nos Estados Unidos, 94,9% superior ao do Canadá e 9% mais caro que na Alemanha.”
No entanto, este ainda não é o principal problema: o Brasil também figura no topo das estatísticas quanto a ineficiência do setor elétrico. De acordo com dados do relatório “O Setor Elétrico Brasileiro e a Sustentabilidade no Século 21 – Oportunidades e Desafios”, o país perde mais de 20% de energia no sistema de transmissão elétrica, ou seja, no processo que se dá entre as usinas e consumidores. Essas perdas de energia seriam responsáveis por aumentar em 5% a tarifa média paga por cada um de nós. Para se ter uma ideia, segundo o levantamento, no Chile as perdas no sistema de transmissão de energia elétrica não chegam a 6% e na Europa estão em 7%.
Obviamente, tudo que é perdido é absorvido por nós consumidores. Arcamos com tarifas altas e, ainda assim, usufruímos de um serviço precário e de manutenção deficitária. Grande parte desta perda é causada, por exemplo, pelo investimento do governo na construção de hidrelétricas distantes das grandes cidades, aumentando cada vez mais o custo da transmissão de energia produzida. Para dizer de forma simples, quanto mais longe a energia é produzida, mais caro fica para trazer ela até você.
Segundo a advogada Oriana Rey, assessora do Programa Eco-Finanças da Amigos da Terra – Amazônia Brasileira: “as consequências da transmissão de longa distância, que ainda carecem de manutenção, são claramente perceptíveis pela população, afinal, as falhas nas linhas de transmissão, muitas vezes, acarretam nos denominados ‘apagões’ que se tornaram recorrentes na realidade da população brasileira nos últimos anos”.
O documento final apresentado com o relatório afirma ainda que “os impactos e riscos socioambientais de hidrelétricas são tipicamente subestimados ou mesmo desconsiderados nos estudos inventários de bacia e relatórios de impacto ambiental (EIA/Rimas) e, portanto, nas análises de viabilidade econômica dos empreendimentos”. Como exemplo, a pesquisa traz os dados de que, no ano de 2011, aproximadamente 33 milhões de habitantes, de pelo menos oito estados, ficaram mais de quatro horas sem luz. Dois anos antes, em 2009, foram 70 milhões em dezoito estados.
Quais os principais problemas por trás disso e qual a responsabilidade da Eletrobras?
Se formos olhar com atenção, podemos perceber que quase todos estes problemas são causados pela maneira como funciona a estrutura do Estado brasileiro. A máquina inchada e os entraves dos sistemas políticos acarretam em problemas como os que vivem hoje a Eletrobras que, estima-se, perde cerca de 4 bilhões por ano em valor de mercado. Segundo o cálculo da empresa 3G radar, esse seria o custo extra da empresa nas áreas operacionais e administrativas comparados aos indicadores de empresas privadas do mesmo setor. De acordo com Pedro Batista, chefe de análise da gestora, em 15 anos, esse custo acumulou R$ 85 bilhões. Para ele, “o montante seria suficiente para manter seis meses de energia de graça para os brasileiros.”
O cálculo da 3G compara os índices da Eletrobras, sem incluir as distribuidoras, com outras empresas privatizadas de geração de energia, além de uma empresa de transmissão. Entre essas empresas estão a Engie, AES Tietê e Cteep. O resultado do cálculo mostra que as empresas privadas pagaram mais impostos ao governo e ainda assim investiram R$ 65 bilhões no setor, enquanto que a Eletrobras investiu R$ 84 bilhões, mas perdeu algo em torno de R$ 20 bilhões com a construção de empreendimentos como as hidrelétricas de Santos Antônio e Jirau, no Rio Madeira, e Belo Monte, no Xingu.
O que mais espanta neste caso é que esses dados, ao lado do fato do setor industrial ter a maior participação no consumo energético brasileiro, deveria ser um alerta para que as empresas procurassem tornar o serviço mais eficiente e de menor custo, mas na prática não é isso que acontece. O resultado de investimentos maiores em eficiência energética poderia assegurar ao setor industrial as condições necessárias para maior produtividade e competitividade.
Segundo destacou o engenheiro Altino Ventura, durante palestra apresentada na PUC ano passado: “O Brasil está perdendo competitividade. A indústria não consegue se manter com tarifas elétricas tão elevadas e os consumidores residenciais estão utilizando menos energia do que gostariam”. Ele completa dizendo que em nosso país, para além das hidrelétricas, temos ainda a possibilidade de investimento em fontes renováveis de energia: “Estamos abrindo portas para outras fontes: térmica, biomassa da cana, eólica, solar. O segredo é estabelecer programas que tenham uma matriz diversificada e que respeite as particularidades de cada região”
O que se pode concluir disso é que, mais uma vez, o governo tem uma dificuldade imensa em entender qual o seu papel diante de suas atribuições enquanto Estado. O caso da energia e falta de eficiência no setor é só mais um exemplo, afinal, por se tratar da base de qualquer indústria, este deveria ser uma área prioritária nos tempos atuais e, principalmente, para o crescimento do país no futuro. Quem corrobora isto é Célio Bermann, professor associado do Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (IEE/USP). Para ele: “São esforços que existem, mas ainda são limitados no sentido de poder proporcionar ao conjunto das empresas industriais condições adequadas para sua produção. Este tipo de observação se amplia para os demais setores de consumo, como o residencial, comércio e serviços e próprio setor público em que a eficiência energética também é fator importante”.
Sabemos que apenas a implementação de novas tecnologias na operação, distribuição e transmissão de energia não seria a solução para todos os problemas do país, afinal infraestrutura é apenas a ponta do iceberg de tudo que precisamos resolver. No entanto, com um investimento focalizado neste setor, priorizando a qualidade dos serviços prestados e, principalmente, a eficiência no uso de nosso dinheiro, poderíamos reduzir custos para as empresas e as indústrias que movimentam nossa economia, melhorar a qualidade de vida de cada um de nós e amenizar significativamente alguns problemas mais urgentes de nosso país.
Fonte: Revista Exame – Instituto Millenium – 10/12/2019
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